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A História

Por João Inácio - Diretor

Como todo bom nordestino, sou fascinado por histórias infantis e em especial as que são contadas por meio de bonecos e objetos. Minha infância foi permeada de situações em que os mamulengos eram a principal diversão. Inúmeras foram as vezes em que os maxixes – que minha mãe cuidadosamente guardava para serem servidos no almoço – sumiam e com alguns palitos de fósforo viravam animais em minha fazenda imaginária. O sábado era um dia especial, pois era quando os artesãos iam pra feira de Bonito, em Pernambuco, e levavam seus bois de barro. Quando possível, meus pais compravam um ou outro boneco pra mim e sempre me advertiam “se quebrar, não vai ter outro”. Mas como uma criança não quebraria um pequeno boi de barro com um vaqueiro montado nele? Claro, as pernas e chifres quebravam, mas na cabeça de uma criança um boi sem chifre ou um vaqueiro sem cabeça é apenas um ser com possibilidades diferentes. Porque o vaqueiro tinha nascido sem cabeça? Será que a mãezinha do boi gostava dele mesmo assim, sem chifres? Eu imaginava as perguntas e respostas, e hoje sei como surgiu meu gosto por escrever roteiros… nasceu com os bonecos.


Já crescido, mas ainda fascinado com a milenar relação simbólica do homem com seus bonecos, há algum tempo, vinha pesquisando o tema e até pensava em um dia produzir um documentário ou algo do gênero, apenas pra explicitar o quão poética e lúdica é essa relação.

Acontece que, no início de 2010, eu estava organizando um workshop de técnicas de animação em Brasília, em que eu ministraria a parte de desenvolvimento de roteiro, o animador Lemuel Massuia ensinaria os fundamentos da “animação 2D” e, claro, logo pensei em alguém que pudesse ensinar como manipular bonecos ou objetos para contar uma história. Na busca desse profissional, inevitavelmente, encontrei a Cia. Truks de Teatro de Animação. Há muito, conhecia a Companhia pelas suas aparições em programas de TV como Jô Soares, Fantástico, etc. Sem muitas expectativas, passei um email e prontamente recebi a resposta, mas colocando uma condição: Só poderiam participar, desde que fosse em um único período… e era exatamente a data que havia reservado para fazer o evento. Acordo fechado. Como nesse caso eu também seria aluno (ora, como perderia uma chance dessa?), convidei e o Henrique Sitchin aceitou se hospedar em minha casa, pois “assim eu teria mais tempo pra aprender tudo que fosse possível com ele”, tramei.


O curso transcorria e eu ficava embevecido, pois era como se “meus bois e mamulengos” voltassem a coexistir comigo. Os alunos ficavam entusiasmados e surpresos com as explicações sobre a “vida dos bonecos”, a força dos seus olhares, gestos, e tantas coisas realmente mágicas que mostravam o quão é complexa a arte de manipular. Para completar a alegria, mais uma coincidência: Nesse período estava acontecendo o Festival Internacional de Bonecos em Brasília e de última hora a Truks foi convidada. Assim, por tabela, também conheci a Verônica Gerchman, co-fundadora da Truks. Pedi autorização pra filmar o espetáculo, e quando vi a Truks se apresentando pela primeira vez, pensei comigo: Nossa, os bonecos parecem que estão vivos! No dia seguinte à apresentação, durante o almoço, comentei com o Henrique que sonhava um dia produzir um documentário sobre bonecos e ele compartilhou que há muito pensava em fazer algo sobre a Truks, mas que nunca tinha dado certo. Eu, atento como bom vendedor, não podia perder a chance de dar um fechamento já que o cliente havia manifestado interesse em comprar: “O que achas de eu fazer o documentário da Truks? Puxa, seria muito bom!”, respondeu. Foi assim que estabelecemos a vontade de fazer alguma coisa, mas no fundo apenas criamos um enorme ponto de interrogação e que apenas desapareceu com o nascimento do filme. Acordamos um desejo mútuo, mas nada estabelecemos sobre condição de trabalho, questões financeiras, direitos autorais, enfim, nada além de “vai ser legal!”. Do lado dele, via claramente, “estampado na testa”, uma pergunta que não queria calar: Quem é esse cara? Será que ele tem condições de fazer um documentário da Truks ou é mais um aventureiro? Do meu lado, ficava pensando: Puxa vida, será que essa gente famosa vai “abrir a vida”, se expor por inteiro e dar todas as informações pra que eu faça um trabalho realmente sério? Terminamos o curso e nos despedimos com um incômodo “vamos nos falando”.


E assim, “fomos nos falando”. Eu mandava um email, mostrava interesse em obter mais informações da Truks e ele gentilmente fornecia os dados à medida que solicitava, mas isso era muito pouco pra fazer um documentário. Mandei um HD e pedi – quase que testando pra ver o que aconteceria – “por favor, coloque o máximo de informações que você puder aí dentro e me mande de volta o mais breve possível. Mande-me fotos recentes e antigas, gravações de vídeos, recortes de jornais, enfim, preciso compreender melhor o que é a Truks”. Por sorte o Henrique é muito organizado e algum tempo depois recebi o HD de volta com muita informação e logo vi que a Truks era realmente o que pensava ser: Uma companhia de teatro famosa, com uma história reconhecida pela crítica, mas havia um detalhe inesperado que me chamava a atenção: Os temas das peças, as críticas dos jornais e entrevistas apontavam pra algo inusitado em um grupo de teatro infantil: Muito mais do que instigar à reflexão, eles tinham algo a dizer, discutir com a plateia, mesmo que alguns temas fossem polêmicos. “Mas não é um grupo que encena peças pra crianças? Puxa, eu pensava que era algo do tipo the dreams comes true”. Aparentemente alguma coisa não se encaixava. Guardei essa inquietação na memória e prossegui com minha pesquisa.


Agora faltava assistir in loco todas as peças, ouvir os atores, diretores, críticos, plateia e todos que me permitissem ter certeza de que havia algo diferente na Truks que justificasse fazer um documentário e não um vídeo institucional ou uma simples matéria jornalística. Nos falamos sobre o assunto e fiquei na expectativa de uma oportunidade para prosseguir com o levantamento de informações.

Passados vários meses o Henrique manteve contato e trouxe uma boa notícia, dizendo que em maio/2011 fariam uma temporada em Brasília e que assim poderia entrevista-los, filmar espetaculos, etc. Lembro- me que falei “já vi que a agenda de vocês é estonteante, vocês não param, mas vou precisar de tempo”. “Fique tranquilo, o pessoal do teatro falou que todo espaço vai estar à nossa disposição”, respondeu. Fui evasivo no comentário e, sem ter culpa, ele foi incompleto na resposta, pois o teatro estaria à disposição deles, mas não considerou que seriam três peças diferentes por dia e que nos intervalos o pessoal do teatro simplesmente sairia, apagando tudo e deixando um mínimo de luz para que montassem o cenário da peça seguinte. A oportunidade foi ótima, filmei todos os espetáculos e fiz muitas entrevistas, mas, como diz meu filho, foi punk!


Quando percebi quais seriam as “condições de trabalho”, logo vi que precisaria ter uma equipe mínima (entenda-se mínima mesmo!), pois não haveria tempo de escolher o melhor cenário para cada entrevista, ter um travelling pra algumas tomadas ou mesmo conceber uma luz mais adequada. Também não poderia ter muita gente e equipamentos, pois não queria tirar a naturalidade da plateia enquanto assistiam à peça. A estratégia deu certo, pois foi uma correria. Quando terminava uma peça, mal os atores interagiam e cumprimentavam a plateia os funcionários do teatro já se preocupavam em desligar as luzes, pois tudo tinha que estar pronto em pouco tempo para a peça seguinte e eu, como louco, tentava com um mínimo de luz fazer algumas entrevistas. No primeiro dia, em meio à essa neura pensei “assim não dá, isso não vai dar certo”. Até que refleti e pensei comigo “espera, o que estou querendo? Se a Truks parar pra encenar pra mim, esteticamente até ficará bonito e isso é importante, mas não será o teatro da Truks e o filme não será um documentário”. Talvez tenha sido essa a decisão mais acertada que tomei em todo processo de criação.

A rotina da Truks é intensa e se eu narrase o documentário sob a ótica de um fã tudo seria diferente e irreal, pois apenas constaria do filme as aparições com maior glamour. Mas isso não seria a Truks, visto que o comum na história deles é, por exemplo, no domingo à noite estarem no Teatro Guaíra, em Curitiba, e na segunda na quadra de esporte de uma pequena escola da periferia de São Paulo. Relaxei e propositadamente deixei no filme cenas com pouca iluminação o que comprometeu muitas vezes o perfeito foco da câmera. Vez por outra, ocorreram ruídos de fundo durante a gravação das entrevistas, pois os demais atores estavam montando o cenário. Enfim, uma correria de louco (isso é mostrado no filme), mas é assim a rotina da Truks e é magnífico como, quando as luzes se acendem, a plateia sequer desconfia que aqueles 50 minutos de pura magia e emoção foram precedidos de tanta transpiração.

Eu tinha um esboço do como seria o arco dramático do documentário e me estruturei pra conduzir as entrevistas dentro do mais cartesiano dos modelos (quem, quando, onde, etc.) e foi aí que o véu começou a se desvendar, estabelecendo um caminho até então inconcebível para mim. Procurei entrevistar os atores em espaços e momentos diferentes, distantes uns dos outros, mas mantendo um padrão na estrutura das perguntas, e foi incrível, porque todos, sem que houvesse uma combinação prévia, mantinham o mesmo padrão na resposta. Indistintamente, reconheciam a importância e a responsabilidade do que faziam no palco, pois prioritariamente são crianças na plateia e tendem a reter informações sem muita crítica. Havia também uma sistemática percepção da missão da “emoção responsável e construtiva” e com isso quero dizer que testemunhei o quanto a Truks vai além do comum na cultura de massa, quando a emoção precede um estímulo ao consumo. Pelo contrário, vi como a reação da plateia ia além dos risos e aplausos.

Durante uma das apresentações, numa escola em São Paulo, a peça encenada era “O senhor dos sonhos”, estava filmando e no momento em que o personagem Lucas senta na cama e lamenta “… Eu faço tudo errado, porque fico sonhando o tempo inteiro…”, uma criança ao meu lado desandou num choro compulsivo e logo foi atendida por uma das professoras. Fiquei refletindo: O que aquela criança havia visto naquele boneco? Ela viu ela mesma! Isso é de uma profundidade sem igual e demonstra como a relação do homem com as histórias contadas por meio de bonecos e objetos deveria ser melhor compreendida pelos pedagodos e educadores, pois essa ferramenta pode ser de extrema validade no processo de educação.


Nas entrevistas, também percebi quantos os atores reconheciam a importância dos fundadores da Truks (Cláudio Saltini, Henrique Sitchin e Verônica Gerchman) e que os princípios por ele desenvolvidos – sobretudo a possibilidade de comunicar com emoção – eram não apenas seguidos como apreciados.

Tendo observado que a Truks é uma companhia que possui uma grande coesão, quando mudam os atores e a mensagem permanece a mesma, algo que se percebe nas famosas companhias como Cirque du Soleil, Stomps, dentre outras, tomei uma decisão: Claro, o filme será meu, terá minha visão sobre o fenômeno, mas não serei um personagem participativo como Michael Moore e outros documentaristas preferem fazer. Embora fosse ótimo para minha autopromoção, não fazia qualquer sentido participar diretamente da história, pois eu não fazia parte dessa história até aquele momento. “Isso! O ideal é que a abordagem seja de um expectador privilegiado, alguém que viu além dos demais e preferiu contar por meio de um filme o que testemunhou”.


Nesse momento, além de excitado com toda situação eu tinha uma encruzilhada e que, por uma questão de princípios, um dos caminhos me levaria a parar o projeto naquele momento. Eu poderia seguir fazendo um documentário no sentido real da palavra – e isso eu gostaria muito – ou apesar de tanto esforço, pararia se percebesse que o Henrique buscaria influenciar o filme para autopromoção ou coisas do gênero. Talvez com medo do que teria que encarar pela frente, deixei a entrevista do Henrique por último. Enquanto isso, desejava ter uma daquelas roupas do Bunraku, pra ficar totalmente vestido de preto, e passar despercebido nesses intensos momentos.



Passei a agir no set de filmagem, quer dizer, no escuro teatro Martins Pena, como um voyer, apenas observava como o Henrique dirigia e coordenava ou como se como se comportava ao aceita ou recusar as sugestões dos atores e técnicos. Enfim, na frente da câmera é comum as pessoas assumirem papéis e eu precisava ter uma visão real de como aquela “família” interagia. Propositadamente, passei a agir quase como um ninja, filmando o que não esperavam e muitas vezes sendo até, confesso, inconveniente. Claro, em um documentário toda informação é bem vinda, mas meu objetivo era outro, pois agora a dúvida que havia sido do Henrique também era minha: Quem são essas “pessoas”? Será que eles tem realmente conteúdo que justifique meu endosso a fim de que tenham um documentário ou são apenas mais um grupo de teatro que ganha honestamente seu dinheiro fazendo peças pra crianças, mas que não possuem diferenciais significativos ao ponto de serem vistos num filme? Os atores foram previamente brifados pra me dizerem exatamente o que eu precisava ouvir? Filmava, coletava informações, e as dúvidas pulsavam em minha mente. A conversa com o Henrique era crucial pra desvendar as muitas dúvidas e talvez agora ele compreenda o porque das muitas perguntas com um cunho tão pessoal.

A entrevista do Henrique foi agradabilíssima. Ele é articulado, expõe muito bem as idéiase apresentou detalhes preciosos sobre toda a história da Truks. Tudo que falava corroborava com o que os atores haviam dito. Pensei “Caramba, trabalhei numa multinacional que investia horrores pra manter uma unidade no discurso dos funcionários e nunca vi tamanha coesão como agora vejo numa simples companhia de Teatro que, como tal, muitas vezes precisa ter atores novos em seu elenco”. Outra coisa interessante, é que o Henrique se colocava como agente da história, mas sem fazer questão de trazer os holofotes sobre si. Antes, enalteceu sem medir palavras a pessoa da Maria da Graça Mendes Abreu, que foi sua mestra no ensino de trabalhar com crianças. Destacou a crucial importância da Eva Furnari na história da Truks e de seus velhos amigos, Cláudio Saltini e Verônica Gerchman, que julgava ser melhores do que ele como bonequeiros. Sou testemunha que fez isso de maneira espontanea, pois até aquele momento eu não havia aventado entrevistar os demais. Eu instigava pra ver se havia um Henrique escondido por detras das falas e a coerência se mantinha. “Mas Henrique, e seus mestres, com quem você aprendeu tudo isso?” Cutucava esperando ouvir algo do tipo “Não tive mestres, porque tudo que vi não era bom e por isso fiz melhor”, e a resposta era simples no sentido de apontar as poucas influências diretas e que a pratica foi a melhor escola. Se havia ainda alguma dúvida sobre o quão importante era o ofício do fazer teatro infantil para a Truks, de uma vez por todas completou o que já havia ouvido dos demais atores: “Temos um acordo na Truks: Não fazemos teatro para nós. Não fazemos teatro pra solução de conflitos nossos ou exposição pessoal. Agimos em direção ao público e se uma pessoa sai de casa pra nos assistir por uma hora, a responsabilidade é sem igual, porque nesse tempo interagimos pra discutir coisas muito sérias”. Claro, essas são minhas palavras e estou sintetizando muito do que ouvi e que está no filme.


Eu já tinha a informação da Companhia de teatro e as percepções de todos os processos envolvendo o mágico mundo dos bonecos, mas será que os co-fundadores e atores antigos, já saídos da Truks, compartilhavam desses mesmos princípios? Seria esse um direcionamento de trabalho ou uma marca que vem desde a criação da Companhia? Porque os co-fundadores já não mais atuavam diretamente? Haviam conflitos pessoais? Se houvessem, como eu trataria essa questão e expor o assunto no filme? E sobre as peças com temas tão complexos e controversos, será que a crítica valorizava esse posicionamento de discutir conflito social entre pobre e rico, por exemplo, com crianças que mal compreendem a questão? E, talvez o mais importante, será que o público consegue decodificar e absorver com profundidade as informações transmitidas nas peças?


A essa altura parte do arcabouço do meu roteiro já tinha ido pro espaço, mas eu estava me deliciando com tudo. Na verdade, isso é que é muito legal em fazer um documentário, pois embora tracemos uma concepção inicial do que queremos mostrar, o dia a dia é que determina os rumos, se a pesquisa inicial estava certa ou se o roteiro apenas estava apontando para a ponta do Iceberg. No meu caso, sem sombra de dúvidas, eu apenas estava olhando a parte de fora de um gigantesco iceberg.


Liguei pro Henrique e tivemos um papo mais ou menos assim:


– Meu caro, está indo tudo muito bem, com o que tenho em mãos já dá pra fazer alguma coisa, mas vai ficar estranho, pois tudo está na primeira pessoa, você falando de você mesmo e isso é meio soberbo. O que achas?”


– Nem pensar! Puxa, seria injusto. A Truks é uma sucessão de envolvimento de muita gente e esse não é um trabalho só meu.


– Okay, então preciso ir pra SP conversar com… (e dei uma lista enorme de pessoas), você me ajuda nesses contatos?


– Puxa, JI, são pessoas muito ocupadas. Posso te indicar os email, mas não creio que pararão suas atividades pra falar sobre a Truks. Você quem sabe, mas temo que se decepcione.


– Além desses, é fundamental ter a opinião de um ou dois críticos teatrais. Não precisam ser famosos, mas é fundamental que sejam respeitados e, sobretudo, que entendam do universo do teatro infantil e dessa relação envolvendo plateia e bonecos.


– Tem o Dib que há muito pesquisa sobre isso, mas também não acho que ele vai parar pra te atender. No máximo, como é muito gentil, vai te responder a um email ou um telefonema.


Pelo receio do Henrique, inicialmente achei que era jogo de cena ou falsa modéstia, mas depois de mais conviver vi que realmente ele não se vê além do que convém e por isso tende a subestimar o que produz. Na verdade, corroborando com a percepção dele, eu mesmo duvidei que essas pessoas pudessem me atender, pois apesar de há muito trabalhar com audiovisual sou um diretor estreante e o peso do nome sempre conta nessas horas.

Qual não foi nossa surpresa, quando todos demonstraram MUITO interesse em participar desse momento da Truks e contribuir com o documentário. Fui várias vezes a São Paulo e interagi com os co-fundadores Cláudio Saltini e Verônica Gerchman, e vi o quão gratos são de participar dessa história. Eva Furnari, a quem o Henrique reconhecia fundamental importância no sucesso da Truks, foi de inestimável valor na sedimentação do conceito e da relação do homem com boneco e objetos.


Dib Carneiro, não obstante ser reconhecido e, talvez, o mais respeitado crítico do teatro infantil brasileiro, não se conteve e se expos ao ponto de dizer que muitas vezes foi difícil exercer seu papel de crítico, pois como plateia ficou arrebatado pela poesia das peças da Truks. Maria da Graça, falou com emoção do encontro inicial com o Henrique e do valor que existe da litaratura e do teatro no processo de ensino. Claudemir Santana e outros atores e alunos davam detalhes que apenas vendo o filme é possível compreender a dimensão do que quero transmitir. Tentei falar com o Toninho Macedo, a quem reconhecem como de vital importância para o início da Companhia, mas apesar dos nossos interesses, nossas agendas não permitiram o encontro. A Karina Praal e Camila Prietto muito me ajudaram nessa produção local e nos papos com os entrevistados. Robson Alexandre foi impar em tudo isso. Sou testemunha que existe muito carinho por parte das pessoas e plateia quando se referem à Truks.
Um bom exemplo disso foi o famoso artista argentino, Carlos Martinez, que morando na Argentina se esforçou pra decodificar meu “portunhol” e gentilmente cedeu as fotos que eu precisava para ilustrar uma cena em que a Verônica o cita como influenciador de sua carreira.

De maneira especial vi como a plateia, independente de sua condição física e social, interage, capta e se emociona com a Truks. Com isso quero dizer que em vários momentos haviam deficientes visuais na plateia interagindo como os demais que não possuem essa deficiência.


Por esse motivo, não me escusei em criar versões do filme com linguagem de tradução em libras para os deficientes auditivos e outra versão audiodescrita para os deficientes visuais. Os que adquirirem o DVD poderão perceber e, quem sabe, ofertar uma cópia para pessoas que necessitam dessas linguagens a fim de poderem assistir ao filme. Com isso, quero estimular que outros diretores ajam de igual maneira, oferecendo alternativas de comunicação (tradução em libras e audiodescrição) a esses públicos.


No final de tudo, entre mais de 500 fotos, filmagens das peças atuais e antigas, propagandas, participações em programas de tv, depoimentos de atores, convidados e plateia, eu tinha mais de 50 horas de informação e agora tinha que resumir tudo isso em um pouco mais de um hora e que mantivesse a essência da Truks que é, ao meu ver, o que há de melhor em termos de poesia… poesia visual.


Nesse sentido, desde o início percebi que a música é um elemento de vital importância nas peças da Truks e precisava que a trilha sonora agisse como esse “personagem virtual” existente nas peças. Graças a Deus fui agraciado com um compositor dentro de casa e meu filho, Matheus Felipe, precisou de pouquíssimas intervenções minhas pra chegar exatamente no que era preciso. Embora suspeito, acho a trilha sonora do filme muito, muito bonita.


Documentário tem dessas coisas. Comecei pensando em fazer um tratado sobre bonecos e me encantei mais pelas pessoas por trás destes. Quando mandei a primeira versão do filme pro Henrique, ele me ligou emocionado dizendo um vbfoiurqporasdjfalkfjalsdfjdsj!!!!! (palavrão impronunciavel aqui), minha resposta foi apenas “Meu caro, meu trabalho está sendo apenas o de colocar um enorme espelho na frente de vocês”.

Um espelho. Um cristalino e brilhante espelho, talvez seja essa a melhor imagem que possa simbolizar e sintetizar tudo que vi e documentei ao longo de 2 anos. Por meio desse espelho que é a Truks, vi crianças refletindo como se fossem adultas e adultos fascinados como se ainda fossem crianças. Um espelho que permite que pessoas não apenas vejam seus dilemas, como também, tenham esperança por meio de proposições positivas de solução. Vi atores responsaveis de sua função e cientes de que seu ofício tem implicações nas vidas dos que os assistem.


Os bonecos no documentário TRUKS não são importantes? Claro que são e é possível ver como são manipulados com rara mestria, mas são apenas bonecos. As pessoas e suas relações é que são a essência e a razão dos espetáculos, essa é a informação central que procurei mostrar por meio do documentário e que é parte da missão dessa maravilhosa Companhia de teatro.


Se a plateia vai gostar do filme ou se ele vai ter aceitação em festivais não sei, mas eu me sinto como um abençoado, pois Deus me agraciou com uma dádiva bem maior do que eu poderia pedir: documentar a vida da TRUKS e fazer um filme que leva simplesmente o seu nome.


Para mim, e espero que você veja isso por meio do filme, Truks é uma companhia de Teatro… mas é coisa de cinema!